Jó 2.6 - Nas Garras do Diabo?!

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Jó 2.6 - Nas Garras do Diabo?! Acessos: 97
Pr. Henrique Araujo

Nas garras do diabo – Jó 2.6

Henrique Ribeiro de Araujo



É comum e natural desejarmos estar nas mãos de Deus. Compreendemos que ali é o melhor lugar para se estar. Porém, o que fazer quando o próprio Deus nos entrega nas mãos de Satanás? Após a primeira investida de Satanás acusando Jó e retirando-lhe seus bens materiais e filhos, Satanás insiste uma segunda vez e acusa-lhe de não ser provado em sua própria vida. Deus lhe diz: “Eis que ele está na tua mão; poupa, porém, a sua vida” (Jó 2.6).

Deus entrega Jó nas garras do diabo pois sabe que não é o lugar que muda o caráter resoluto de uma pessoa. Jó foi mais fiel nas mãos do diabo do que Ananias nas mãos de Deus. O lugar no qual estamos pode facilitar ou dificultar o exercício de nossas ações, porém a deformação ou aprimoramento do caráter parte da resolução da vontade. A vontade é norteada pelo que creio e o que creio deve ser fruto da fé em Deus e na Sua Palavra.

Em nossa vida podemos deixar nossas vidas nas mãos de Deus (Jó 42.10), nas nossas próprias mãos (Jó 40.14) ou nas mãos do diabo (Jó 2.6). Entretanto, o lugar não é o fator determinante de como conduzimos nossa vida. Lúcifer estava no céu (Ap 12.9) e abandonou sua integridade. Davi diz que no Vale da sombra da morte cria que Deus era com ele (Sl 23.4).

Deus entrega Jó nas mãos do diabo não por embarcar na proposta de Satanás. Antes, Deus, prescientemente, sabendo que Jó passaria por todas as intempéries e contrariedades e seria aprovado, permite que Satanás toque em Jó por já saber que Sua glória seria manifesta mais ainda na vida de Jó. Assim sendo, não é Deus que submete-se aos caprichos mefistofélicos apostando sobre Jó, mas sim Deus que sendo sabedor de todas as coisas e tendo o controle de tudo, permite a situação para manifestar mais e mais a Sua glória. Através desta situação, Deus forja o caráter de Jó e o abençoa duplicadamente (Jó 42.12) e glorifica Seu nome por sua glória e sabedoria (Jó 42.2-5).

Interessante é notar também que, apesar do autor bíblico (provavelmente Moisés) nos dizer que Deus entregou Jó nas mãos do Diabo (Jó 2.6), em todo o tempo Jó e seus amigos entendem este mal como vindo de Deus (Jó 6.4, 5.18, 9.13, 12.9, 4.13, 19.6, 21, 30.21). Entretanto, seus amigos atribuem a imputação deste mal à uma suposta causa de injustiça de Jó. Jó não aceita ser acusado de injustiça. Defende-se de todas as formas, mas deseja o porquê deste mal. Posteriormente, Eliú deseja chafurdar mais ainda Jó na acusação de injustiça multiplicando argumentos para isso (Jó 33.3, 13, 33, 34.37, 35.7, 36.2).

A doença de Jó foi extremamente implacável. Será que sua doença era lepra? Pois tendo sido uma doença colocada pelo diabo e conduzindo seus amigos a especulações tão ferinas, poderia ser uma doença que fosse considerada como maldição divina e extremamente impura para os próximos.

Sua doença não era apenas interna, mas também tinha algum aspecto e manifestações externas, visto que Jó raspava suas feridas com um pedaço de telha (2.. Era uma doença generaliza e não apenas localizada pois alcançava desde o alto da cabeça até a planta do pé (2.7). Sua dor era muito grande (2.13). “O mal que me corrói não descansa” (29.17) é menção que Jó faz a respeito de sua doença.

Fisicamente, sua doença fazia feridas tão intensas que bichos brotavam delas. A doença produzia um gosto ruim em sua boca (6.30). Sua pele estava seca e sem vida e a doença se espalhara por toda ele (7.5). Seu abatimento era visível (16.. Sombras escuras marcavam seus olhos (16.16). Seus membros estavam cansados (17.7). Sua doença o deixou magérrimo (16.8, 19.20) e aflito (29.16). Sua pele tornou-se negra e seus ossos queimavam (30.30).

Psicologicamente, Jó estava arrasado. A mágoa o consumia (17.7). A insônia não o deixava dormir (7.4). Estava deprimido por causa do tédio (10.1). Estava aflito e cansado (30.16, 17). Jó já estava cansado de tanto chorar (16.16), pois tornou-se chacota até mesmo dos adolescentes irreverentes (30.1). A solidão o carcomia, pois seus parentes lhe deixaram, seus conhecidos o abandonaram, seus domésticos não mais o respeitavam, os rapazes o desprezavam e seus conselheiros o abominavam (19.14-19, 30.29).

Angustiava-o ainda lembrar de seu estado anterior (29.8-25). Jó era milionário (1.3). Os jovens fugiam de sua presença (29.. Os idosos se colocavam de pé quando ele chegava (29.. Os príncipes pensavam duas vezes antes de falar diante dele (29.9), assim como os líderes (29.10). Todos falavam bem dele (29.11) e o reconheciam como benfeitor (29.12). Quem estava agonizando impetrava suas últimas palavras abençoando J (29.13). A justiça era sua marca (29.14). Ajudando deficientes (28.15) e necessitados (28.16) e fazendo justiça aos injustiçados (28.17). Aguardava morrer em paz (28.18-19). Era honrado (28.20) e ouvido (28.21-23). As pessoas nem acreditavam quando ele esboçava um sorriso para elas (28.24) e onde estava era dado a ele lugar de honra entre os reis e generais (28.25).

O que Jó fez enquanto esteve entregue nas garras do diabo?

Primeiramente, Jó não buscou explicações absurdas, antes buscou a razão de tudo e tentou manter a razão (Jó 13.17, 21.2, 24.25). Enquanto seus amigos davam explicações absurdas e opiniões funestas (Jó 32.11, 17), Jó advogava que suas explicações eram ilógicas e irracionais e não podia concordar com elas (Jó 6.7). Jó queria entender (Jó 6.24-25).

Em segundo, Jó manteve a fome pela justiça (Jó 19.7) Elifaz acusa Jó de ser injusto (Jó 4.17); Bildade também o faz (Jó 8.3, 25.4); Eliú também (Jó 33.12, 34.5, 35.2). Jó reconhece que o ser humano, de forma geral, é injusto e que Deus é justo (Jó 9.2-4). À luz da perspectiva da injustiça humana, Jó mesmo declara que ainda que fosse justo, discutindo com Deus pediria misericórdia (Jó 9.15). Ele reconhecer que é injusto como todo o homem (Jó 19.4), mas ele quer ir ao tribunal para saber, pontualmente, por que está “sendo punido” (Jó 23.3). Porém, Jó entende que, de forma específica, ele não praticou injustiça, era um homem justo (Jó 27.6, 29.14). As acusações de seus amigos são falsas (Jó 21.34). Quando Deus se revela diante de Jó, o convida para o debate sobre justiça e juízo (Jó 40..

Terceiro, Jó continuou declarando sua fé. “Eu sei que meu redentor vive” (Jó 19.25-26) é a declaração de fé mais conhecida de Jó. Entretanto, Jó ainda diz que: enquanto viver não pronunciará engano (Jó 27.3-4); ainda que Deus o mate, ele esperará em Deus (Jó 13.15); sabe que Deus pode tudo e nenhum de Seus propósitos pode ser impedido (Jó 42.2).

O que fazer quando, aparentemente ou realmente, estivermos nas garras do diabo por permissão Divina? Que lições podem ser exauridas à luz da vida de Jó?

Primeiro: Não julgue a pessoa que está passando por um momento contrário em sua vida. Pode ser Deus forjando seu caráter. Pode ser colheita de sua própria semeadura. Pode ser o diabo investindo contra ela. É-nos vedado emitir julgamentos (Mt 7.1; Lc 6.37; Tg 4.11). Nosso juízo sempre será reducionista (por ser de um ponto de vista limitado) e subjetivo (por emitirmo-lo por meio de nossa opinião e dados acessíveis). Deus é o Justo Juiz. Sua Justiça e Juízo são perfeitos por Ele ver de forma global e objetiva.

Segundo: Mantenha o equilíbrio e a razão. Muitas pessoas tentando encontrar causas espirituais em questões naturais frustraram-se ao não encontrar respostas, atribuindo a Deus a culpa que não lhe é devida. Não devemos atribuir causas absurdas e estapafúrdias a situações que não sabemos explicar as causas. Devemos avaliá-la lógica e racionalmente, mas lembrar que a fé não é ilógica, ou a-lógica, mas supralógica. Quando a razão não responder, após reflexão, caminhemos na fé de que Deus está no controle e sempre quer o melhor para nós. O Autor de Hebreus diz que “pela fé entendemos” (Hb 11.3) e Jesus diz que às vezes “o que faço agora não entendeis, mas saberás depois” (Jo 13.7).

Terceiro: Aproveite para compartilhar a sua fé. Quantas gerações já foram abençoadas pela história do justo Jó? Louvamos a Deus porque Jó manteve-se firme em sua fé e compartilhou-a conosco para também mantermo-nos assim. Willian Carey morou em um pântano, teve dois de seus filhos mortos, sua esposa enlouqueceu, teve que desdobrar-se entre o trabalho missionário e em uma fábrica de anil para batizar o primeiro decidido após oito anos de trabalho na Índia. Após o que, a obra missionária de Carey espraiou-se. Ele manteve firme sua fé e serviu de inspiração a outros. Aproveite este momento contrário para fazer como Jó e também como Paulo, quando estava preso e declare: “Eu sei em quem tenho crido” (2Tm 1.12). Porém isso só é possível ser declarado por quem realmente conhece Deus.

Quarto: Confie que Deus fará justiça. Se Deus lhe permitiu, assim como Jó, ser entregue para ser provado nas mãos do diabo por algum tempo, Ele te dará o escape (1Co 10.13). Abraão nos lembra que “não fará justiça o Juiz de toda a terra”? (Gn 18.25). O profeta lembra a Amazias, que ainda que tenhamos sofrido o dano: “Mais tem o Senhor a nos dar do que isso” (2Cr 25.9).

A conclusão não pode ser outra, senão o que Tiago diz: “Eis que temos por bem-aventurados os que sofreram. Ouvistes qual foi a paciência de Jó, e vistes o fim que o Senhor lhe deu; porque o Senhor é muito misericordioso e piedoso” (Tg 5.11).